
O mar começa a acalmar, já passamos a Travessa, acabaram-se as correntes, estamos outra vez a navegar num oceano calmo e limpo, ao longe vislumbra-se terra e dentro da lancha começa o burburinho de quando se avista a costa, alguns de alivio, porque chegaram a casa, outros de admiração, pois é a primeira vez que visitam a ilha. E o sol e que bela praia dourada , uma longa extensão, dez kms de areal, limpo e dourado banhado por um oceano de águas transparentes, convidando para um belo mergulho. E, eu? Que faço? Começa o desassossego de quem não sabe como escapar do que virá a seguir....... Finalmente a lancha atraca e eu já pronta para me escapulir, sou agarrada por um braço, o arrás não me deixa fugir, e pergunta e então os teus primos? É claro, nada de primos, na cabeça do homem começa a fazer-se luz e diz, bem vou ter de deixar em casa de umas pessoas amigas e amanhã venho buscar-te para te levar para casa. E eu, não senhor, eu fico aqui, esperando os primos, eles ficaram de me vir buscar. Nã, nã, nã, nã senhora, já te disse piquena, ficas em casa dos meus amigos e acabou-se, amanhã levo-te de volta. Lá fui, contrafeita, agarrada por um braço, com vontade de fugir, mas não podia, tinha de me render às evidências, não podia despertar a fúria dos adultos. já sabia o que isso significava. Não fazia mal, estava a salvo, por mais um dia. Chegámos a uma casa, ladeada por um muro alto pintado de cal branca, tinha uma porta de madeira estreita pintada de verde, subimos uns degraus e estávamos num quintal, coberto por um corredor de vinha, de Uva Branca, do Porto Santo. A casa era pequena, em forma de L, do lado direito era a cozinha, e na extensão maior, os quartos; eram dois, o do casal e outro seria o das visitas, não tinham filhos; naquele dia iria dormir naquele quarto, simples com uma cama de solteiro que estava feita com esmero e cobria-a uma colcha de algodão branco, seria meu até ao dia seguinte, e eu pensei, um quarto só para mim, que sorte a minha. A casa era modesta e as pessoas também. Não me lembro do nome das pessoas, só me lembro de me tratarem muito bem, o dia seguinte era domingo, a senhora fez sopa de pombo, a primeira e última vez que comi semelhante iguaria, pois o marido era criador de pombos. Disse-me que despisse o vestido que trazia, as calcinhas e as peúgas para lavar, deu-me uma tshir-t de algodão a fazer de vestido, e também queria a bolsinha azul, e aí rspondi, que nã senhora, a bolsinha é minha. Perguntou-me, se me importava de varrer o quintal, claro que não me importava, até foi um divertimento, havia uma árvore que deixava cair umas bolinhas, com o pé esmagava as bolinhas e depois varria, não sei quando tempo durou a esta tarefa, mas foi divertida, ninguém me ralhou por estar a brincar e a varrer, ninguém achou anormal que brincasse com a vassoura, afinal era só uma criança de oito anos, que mal podia fazer... Lembro-me, de ter gostado muito da sopa, era a hora do almoço o tempo estava mesmo, mesmo, quase no fim e a minha agonia voltara, teria de voltar ao barco, o arrás da lancha estava de volta para me levar, e eu sem ter possibilidade de fugir. O arrás aconselhou que agradecesse aos senhores, mas eu estava mais que agradecida, até nem me importaria que adoptassem, ficaria ali para sempre, com muito gosto. Já de volta e o arrás esteve sempre olho em mim, não me lembro de ter chamado a atenção de nenhum dos viajantes, o que foi um alivio, pois tinha de deitar ao golfinhos o que trazia na bolsinha azul, e aí quando julguei que ninguém estava a ver, atiro ao mar o meu tesouro, o bife, que guardava à três dias. Ainda , hoje me lembro do cheiro daquele bife, estava crú, já tinha saido e entrado no frigorifico pelo menos duas vezes, e uma vez guardado na minha bolsinha, nunca mais de lá saíra, pois não o podia mostrar a ninguém, era denunciador do meu crime, e jamais deixaria que outros soubessem, pois tinha saído de casa para comprar um bife e não tinha voltado. Esta história, não acaba aqui, vou ter de escrever o resto, até breve..... |
5 comentários:
esta era uma criança aventureira... a caçula.
ainda hoje é uma criança, ainda hoje se atira para a frente, ainda hoje lhe reencaminhei um email porque achei que era a cara dela...
uma mulher de força... de coração... de tripas coração... de trigo sarraceno... de poções mágicas... de carinhos cheios de amizade... dá-me conselhos com olhos tristes... pergunat-me se estou zanagada com ela... eu?...
porque faço silêncios!... porque os faço, amiga... sempre os fiz...
nunca estou zangada contigo...
obrigada pela tua história e por muitas outras coisas...
amigas para sempre?
luísa
O tempo é sombrio, misterioso, bem o sei, mas não é o segredo oculto na carta da minha irmã, ou no mundo em redor do meu telhado. É demasiado vago, o tempo sopra em todos os segredos.
A minha mãe temo que se encontre perdida na escuridão dos seus próprios olhos, resta-me a minha irmã e mais quem vier por bem, para descobrir o caminho que me leve de volta até ela.
Por cada carta um segredo, só assim vou preencher cada ausência em mim...
Por favor continua a visitar o meu telhado e a trazer novas esperanças...
www.acriticadarazaopura.blogspot.com
os golginhos são seres maravilhosos...mereceram por certo o bife que lhes deste.
claro que mereceram, o que eu não sei, é se o bife ainda estava em condições de ser consumido, se fosse agora, tinha a asae a perna...
pingência, quando escreves essas coisas, fazes-me chorar e eu depois não sei responder a esses carinhos da mesma maneira...
beijos, obrigada por estares aí.
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